UNE - Coordenação de Mulheres

Pelo fim da violência sexista no ME!

Documento aprovado durante o III Encontro de Mulheres Estudantes da UNE, Belo Horizonte, 1° a 3 de maio de 2009

Pelo fim da violência sexista no ME!

Violência sexista é aquela que é praticada contra as mulheres, produto das relações desiguais entre homens e mulheres que há na nossa sociedade, e é praticada por homens em diversos espaços da vida social.
Mesmo nos espaços dos movimentos sociais, é comum observarmos que a violência existe. Porém, entre militantes que lutam para transformar o mundo, e portanto, as relações desiguais que o caracterizam, é ainda mais inaceitável que esse tipo de prática siga tomando lugar, e servindo como uma forma de disputa e de expressão de poder.
Historicamente, a construção social do lugar de homens e mulheres na nossa sociedade, que toma corpo na divisão sexual do trabalho, reserva para as mulheres o espaço privado, enquanto é dos homens o espaço público. Por isso, os espaços da política são, muitas vezes, caracterizados como masculinos, tanto em seus símbolos e estruturas quanto nas próprias relações internas às entidades. No movimento estudantil, não é diferente.
Nos fóruns da UNE, assim como na construção cotidiana da entidade, muitas vezes, observamos que companheiras são desqualificadas de diversas formas. São poucas as que transpõem as barreiras que nos excluem dos espaços de maior exposição, e mesmo aquelas que lá estão, são colocadas em situações de constrangimento, como a de ouvir assovios e gracejos ao subir ao microfone para defender a opinião política que representam. Sem falar na truculência que caracteriza os espaços de disputa, trazendo a violência como se fosse um adendo “natural” da divergência.
Por isso, nós, mulheres militantes do ME, reunidas na cidade de Belo Horizonte, no III Encontro de
Mulheres Estudantes da UNE, apresentamos ao conjunto do movimento a proposta de criar, efetivamente, meios de coibir atos de violência sexista em nossos fóruns e instâncias, prevendo, inclusive, punições àqueles que a praticarem.

Tipificação

Antes de mais nada, é preciso caracterizar adequadamente a violência sexista. Além da forma mais conhecida, a agressão física, há outras formas de violência, que inclusive, se não forem devidamente inibidas, podem levar à agressão física também. Uma delas é a violência psicológica, que significa a desqualificação pública das mulheres, agressões verbais, através de gritos e xingamentos, muitos deles marcados por constranger a mulher a partir da sua sexualidade.
Também é mais comum do que gostaríamos situações de assédio e de violência sexual. Esses assuntos são tratados como tabus, como se devessem se resolver no âmbito privado, mas é preciso estabelecer tratamento político aos casos que aparecerem.

Método e política para enfrentar a violência

Fóruns da UNE, como Conebs, Conegs e Conunes, ou mesmo reuniões da entidade ou convocadas por ela, são espaços em que a opressão machista pode se materializar em atos de violência. Neste momento, especificamente, pré-Conune, de disputa de delegações na base do movimento, mas também de disputa de encaminhamentos entre aqueles que organizam essa base, são muitos os casos de violência contra mulheres. Além disso, mesas de credenciamento apresentam um vasto histórico de situações de agressão de diversos tipos.
Condenar os atos praticados não é suficiente para coibir a violência. É necessário transformar a cultura política do movimento estudantil, ainda muito marcada pelo machismo, e ter uma compreensão coletiva de que a violência sexista é intolerável, especialmente quando se dá em espaços de organização do ME. Para tanto, é necessário que a UNE assuma a responsabilidade de criar meios para evitar que esses atos permaneçam acontecendo, e que preveja de antemão possíveis sanções àqueles que o praticarem.
Denúncias de caso de violência que ocorrerem em fóruns, instâncias, reuniões ou mesmo no espaço físico da UNE, devem ser encaminhadas à direção da entidade, que deve proceder da seguinte forma:
1)      Definir uma comissão de apuração composta por 3 integrantes da executiva nacional da UNE, acompanhada pela diretoria de mulheres, para averiguar as denúncias feitas, ouvir os envolvidos e promover o debate no interior da entidade;
2)      Essa comissão terá prazo de 20 dias para encaminhar esses procedimentos e, ao final desse processo, levar à direção da UNE uma proposta de sanção ao agressor, no caso de as denúncias se confirmarem;
3)      As sanções possíveis, em se confirmando a agressão, poderão ser:
a. Nota pública da UNE em censura ao agressor;
b. Afastamento do agressor do espaço em que a agressão se deu;
c. Inelegibilidade do agressor, por período determinado, para qualquer fórum ou instância de direção da UNE;
d. Na hipótese de o agressor ser membro da direção da UNE, o mesmo poderá ter sua indicação substituída pela chapa que compôs.
4)      Em não se confirmando a agressão e se comprovando a não veracidade da denúncia, o autor ou autora da mesma deverá ser submetido(a) a retratação pública nos veículos e espaços políticos cabíveis.

4º Encontro de Mulheres Estudantes da UNE (EME) é lançado no CONEB

 

 

Elas querem mais espaço. Mais espaço para falar e serem ouvidas. Mais espaço para participar das decisões fundamentais da sociedade. As mulheres conquistaram muito, mas ainda têm muito mais a alcançar. Essa reflexão resume o debate realizado no domingo (16) primeiro dia oficial de atividades do 13º CONEB.
Faltou foi espaço físico no auditório reservado para a discussão, no CT da UFRJ. Mulheres e homens procuravam se acomodar da melhor forma para participar do encontro que reunia uma mesa de peso. Era formada pela ex-presidente da UNE, Lucia Stumpf, ex-vice da entidade, Louise Caroline – atualmente secretária de mulheres da cidade pernambucana de Caruaru-, Ana Cristina, da Marcha Mundial de Mulheres, Conceição Cassano, da secretaria geral da Confederação das Mulheres do Brasil, e Elza Campos, da União Brasileira de Mulheres. A mediação ficou por conta da diretora de Mulheres da UNE, Fabíola Paulino.
A pauta central do debate foi a eleição da primeira mulher presidenta da república, Dilma Rousseff.  “O que significa a eleição de Dilma Rousseff como presidenta do Brasil? Não veio sem que fosse pago um alto preço nos debates das bandeiras feministas no Brasil. Vimos o grau de conservadorismo que existe durante a campanha eleitoral. Dilma teve que pagar o preço- bandeiras feministas não puderam ficar em cena, por conta da força desse conservadorismo – como o direito ao aborto”, provocou Louise Caroline.
Para Ana Cristina, a eleição representou “uma vitoria no imaginário político brasileiro. Não resolve, mas constrói uma perspectiva de sociedade. Dilma se propôs a abrir alas. Ela caminhou junto com a luta das mulheres brasileiras”, defendeu.
As mulheres presentes procuraram dar a dimensão da importância da eleição de uma mulher para a presidência da república de um país ainda de cultura patriarcal e machista. Também em discussão a participação das mulheres na política “ainda muito débil”, disse Conceição. 
Estatísticas de violência contra a mulher também foram faladas, causando surpresa em muitos dos homens presentes. “A cada 15 segundos uma mulher sofre algum tipo de agressão no país”, disse uma das convidadas.
“O debate sobre o feminismo no 13º CONEB foi muito importante, pois trouxe à tona assuntos de imensa relevância como, por exemplo, o aborto, valorização da mulher ou mesmo a dificuldade de ela ter seu espaço garantido nos diversos locais em que procura se inseri”, apontou Lukas Thiago Cardoso, aluno de pedagogia da Universidade Estadual de Goiás (UEG). Ele revelou ter noção do que sentem as mulheres, já que vive rodeado delas na universidade em um curso predominantemente feminino. Justamente por isso apontou outro dado curioso. “Gostaria de mencionar o fato de as mulheres em grande escala ainda serem machistas, o que podemos perceber por conta da educação familiar e escolar - que na maior parte das vezes é responsabilidade delas -. Enfim, foi um grande debate e nos proporcionou uma ótima tarde de discussão bem politizada”, concluiu.

4º Encontro de Mulheres Estudantes da UNE - EME
Não por acaso, sob o slogan “ô abre alas que as mulheres vão passar” foi lançado o 4º Encontro de Mulheres Estudantes da UNE (EME). O evento será de 21 a 24 de abril em Salvador, Bahia. “É o feminismo para mudar o mundo, o movimento estudantil e a universidade”, disse Fabíola Paulino.
Orgulhosa de participar da inauguração de mais um EME,  Lucia Stumpf declarou que a pauta da mulher deve ser sempre destaque nos assuntos do movimento estudantil.  Até porque “a universidade brasileira é um espaço ainda predominantemente masculino, machista. É muito apropriado o tema deste CONEB ‘nas ruas de hoje o Brasil do amanha’. Será nas ruas que vamos conquistar mais e mais direitos e influir no empoderamento da mulher no movimento estudantil”, disse a ex-presidente da UNE.
O EME conta com diversos grupos de trabalho e mesas de debate sobre questões ligadas à opressão de gênero. Além disso, é também um espaço para se discutir o papel da mulher no movimento estudantil, na produção de conhecimento e na sociedade.
“Em conjunto com o movimento feminista, as estudantes estão mobilizadas por bandeiras que avancem na superação da desigualdade e na conquista de liberdade e autonomia das mulheres”, defende a diretoria de Mulheres da UNE. Portanto, agende-se.

Declaração do III Encontro de Mulheres Estudantes da UNE

Documento aprovado no III EME, Belo Horizonte, 1° a 3 de maio de 2009

Carta III EME-UNE

Nós, mulheres reunidas no III Encontro de mulheres da UNE, reafirmamos a necessidade do combate ao machismo na nossa sociedade, em todos os espaços. Enquanto universitárias percebemos que o espaço da universidade também precisa ser transformado. O machismo continua latente tanto nesse espaço quanto no movimento estudantil. No sistema capitalista, a cada dia, os donos do poder reinventam a opressão na forma de novos padrões de beleza e de consumo. A Universidade continua tratando a nós, mulheres, como seres invisíveis à ciência, o que ajuda a manter as relações de poder na sociedade. Somente a ação das mulheres organizadas é capaz de superar essas e outras expressões da opressão.
Nos últimos anos, os EMEs e a organização permanente das estudantes permitiu que a UNE incorporasse bandeiras feministas em sua agenda política. Frente à ofensiva conservadora contra as mulheres, a campanha da entidade pela legalização do aborto que contribuiu para pautar, na problemática do aborto da sociedade brasileira, o direito das mulheres sobre seus corpos e suas vidas.
Avançamos em vários aspectos, mas ainda percebemos a desqualificação das mulheres nos espaços de militância. O movimento estudantil e os espaços políticos ainda são composto majoritariamente por homens. A luta e a militância das mulheres continua sendo colocada em segundo plano. São muitos os exemplos das relações de opressão no interior do ME que precisam ser superadas. O combate ao machismo no movimento estudantil é atual e necessário para que este seja uma ferramenta de transformação desta sociedade em direção a um mundo mais igual para homens e mulheres.
A auto-organização das mulheres constrói uma prática feminista na Universidade e no movimento estudantil, e é fundamental para combater todas as expressões do machismo. Organizadas em coletivos feministas e no movimento estudantil, as mulheres estão em luta para combater a desqualificação, o assédio e a violência contra as estudantes na vida universitária.
Neste EME, reafirmamos a compreensão de que o machismo enfrentado cotidianamente na universidade não está desconectado da opressão do conjunto das mulheres sob o capitalismo. Esse sistema se apropria das desigualdades de gênero e raça, assim como intensifica a discriminação com relação a sexualidade.  O processo de mercantilização, característico do neoliberalismo, também está na universidade e organiza a produção de um conhecimento ainda machista. As parcerias publico-privadas e as leis de propriedade intelectual potencializam esse processo. As indústrias farmacêuticas, de alimentação e de cosméticos financiam e direcionam suas linhas de pesquisa, contribuindo para a manutenção do padrão de feminilidade e opressão das mulheres.
A inserção das mulheres no mercado de trabalho continua marcada pela desigualdade, que se expressa, principalmente, nos salários em média 30% inferiores aos dos homens. Apesar de comporem atualmente 55% das universitárias no Brasil e de ter elevado seu nível de escolaridade, as discriminações permanecem. São necessárias transformações estruturais na sociedade para superar a opressão e construir igualdade para todas as mulheres.
Em uma conjuntura de crise global, as mulheres, sobretudo as negras e jovens, são as primeiras a sofrerem os impactos dos rearranjos feitos para salvar o sistema. O aumento das demissões e o corte dos investimentos em áreas sociais penalizam mais as mulheres, que passam a acumular tarefas que deveriam ser garantidas pelo Estado. Soma-se a isso o fato de a pobreza ser maior entre elas, de ocuparem os trabalhos mais precarizados e de serem alvo fundamental de avanço da mercantilização expressa em seus corpos. O aumento da pobreza, da precarização trabalhista e da mercantilização de tudo quanto for possível intensifica a opressão. No receituário anti-crise da maioria dos governos observamos o envio de grandes volumes de dinheiro à empresas e bancos, a reafirmação do modelo de consumo e o endividamento dos mais pobres. Nenhuma dessas propostas é capaz de responder aos profundos impactos da crise sobre a classe trabalhadora. As mulheres dizem não ao avanço do capital e à diminuição do social, refletida na super-exploração do seu trabalho e nos negamos a pagar a conta de uma crise que não é nossa.
Frente a essa realidade, as mulheres reunidas no III EME-UNE, tendo como eixo o combate ao machismo no movimento estudantil e na universidade, destacam como prioridades para sua atuação coletiva:

As mulheres transformando a universidade

A ação das estudantes organizadas em coletivos feministas e no movimento estudantil terá como ponto de partida a denúncia das diversas expressões do machismo na universidade. Os rearranjos da divisão sexual do trabalho, a desvalorização das carreiras femininas, ligadas ao cuidado, e a falta de investimento nesses cursos são elementos centrais neste debate. A elaboração de políticas de assistência estudantil que contemplem as mulheres passa pelo reconhecimento dos obstáculos específicos da permanência delas na universidade. Assegurar creches, atendimentos de saúde, moradia, transporte universitário, alimentação e bolsas, com garantia de recursos específicos das universidades para tais políticas é central. A realização de campanhas sobre assistência estudantil, com corte específico de gênero nas universidades é fundamental.
A construção de uma universidade não sexista depende da defesa da qualidade da educação como um todo. Por isso é importante que as mulheres tenham uma leitura sobre as políticas educacionais e estejam organizadas para que estas contemplem sua demanda específica. A defesa do aumento de verbas para a educação, do papel social da universidade e do tripé ensino-pesquisa-extensão também é uma bandeira das mulheres.
A denúncia do direcionamento das pesquisas, financiadas por empresas privadas e voltadas para o mercado, combinada à crítica global à mercantilização da vida, deve ser uma tarefa cotidiana. Devemos buscar linhas de financiamento próprias para programas de pesquisa de gênero que visem identificar as dificuldades e problemas presentes  na realidade das mulheres da nossa sociedade, elementos necessários a nossa luta pela superção dos preconceitos e do machismo. É preciso também garantir que as mulheres estudantes participem e contribuam na formulção desse programas. Além disso, é necessário incorporar disciplinas sobre gênero e a história das mulheres nos diferentes cursos de graduação.

Pelo fim do machismo no movimento estudantil

 A auto-organização permanente é nosso principal instrumento para combater a desqualificação e a violência que as mulheres sofrem no ME, onde o machismo é  existe e se reproduz, assim como na organização da nossa sociedade. O conjunto do ME deve se comprometer com o combate das práticas machistas. Apesar de sermos parte expressiva da base do movimento, as entidades representativas são compostas majoritariamente por homens. A UNE e as UEEs devem cumprir as cotas mínimas para mulheres nas direções. É preciso avançar na formulação da política de cotas, implementando-as tanto no pleno quanto na executiva das entidades e criar mecanismos que garantam seu cumprimento, como a obrigatoriedade de que as chapas apresentem o mínimo de 30% de mulheres no momento da inscrição e posse, assim como a inclusão das cotas no estatuto das entidades gerais. Devemos, também, estimular a criação de diretorias de mulheres na rede do movimento estudantil como um todo, para garantir a auto-organização das mulheres e, consequentemente, avançar na visibilidade das pautas das mulheres, e da perspectiva feminista na construção de
Através dessas diretorias e das mulheres organizadas nos núcleos das universidades, devemos criar espaços de discução ampliados, em conjunto com os companheiros do movimento estudantil, onde seja possivel travar o debate  sobre a questão da mulher e construir coletivamente a superação dos preconceitos no movimento e na sociedade.

Mulheres em movimento:

Em conjunto com o movimento feminista, as estudantes estão mobilizadas por bandeiras que avancem na superação da desigualdade e na conquista de liberdade e autonomia das mulheres. Estamos comprometidas com a construção da Frente contra a criminalização das mulheres e pela legalização do aborto nos nossos estados e repudiamos a possível instalação de uma CPI do aborto.
O próximo período será marcado por duas Conferências Nacionais que exigem grande mobilização da sociedade civil organizada para a transformação democrática e igualitária de nossa sociedade. A Conferência de Comunicação, espaço privilegiado para disputar a democratização da mídia, é fundamental na luta das mulheres contra a mercantilização dos corpos e todas as outras opressões que vivemos cotidianamente, uma vez que a mídia é essencial na formação/produção das subjetividades moldadas pela cultura hegemônica. Nossa participação organizada na Conferência da Educação é central na luta pela superação do machismo na Educação Superior. Participaremos ativamente deste processo para garantir a incorporação da perspectiva feminista nas definições dessas conferências.
Os acúmulos e compromissos do EME serão expressados em uma semana de ação feminista nas universidades de todo o país, indicada para setembro. Será um momento privilegiado para o debate da agenda feminista e para a luta política das mulheres por igualdade e autonomia.

Belo Horizonte, 03 de maio de 2009.